A Semana de Arte Moderna foi um golpe de mestre de rapazes persuadidos de que estavam descobrindo o Brasil ou, quando menos, o procurando. E convenceram todo o mundo de que com eles se fizera a grande ruptura entre o Brasil que se ignorava e o Brasil que começava a ser.
O que se concebera como uma diretriz estética, a Antropofagia, na realidade, definia o Brasil, como prova o abrasileiramento, logo na primeira geração, dos filhos dos quase quatro milhões de imigrantes desembarcados em nossos portos entre 1860 e 1922. Éramos uma nação antropófaga, devoradora de tudo que vinha de fora, capaz de assimilar e reproduzir, modificados e enriquecidos, os valores que nos interessavam, eliminado o resto.
O Brasil, contudo, não era só futuro. Tinha um passado de invenção e beleza, que necessitava ser revelado ou revalorizado — como o Barroco mineiro. E tinha um presente riquíssimo, o seu povo. O caipira não era incapaz de arte. O mestiço do litoral não era um desfibrado. Nem o sertanejo, um seco fanático.
Alberto da Costa e Silva. Quem fomos nós no século XX: as grandes interpretações do Brasil. In: Carlos Guilherme Mota (org.). Viagem incompleta: a experiência brasileira. São Paulo: SENAC, 2000, p. 24-5 (com adaptações).