O estopim que deflagrou a Revolta da Vacina foi a publicação, no dia 9 de novembro de 1904, do decreto que regulamentava a aplicação da vacina obrigatória contra a varíola — aprovada por decisão do próprio presidente da República.
Para além das vicissitudes e dos usos políticos — de muitos lados — a que a rebelião se viu sujeita, importa guardar alguns aspectos. Em primeiro lugar, a introdução de uma medicina intervencionista que, em nome da higiene, alcançava espaços inusitados de atuação, que iam do indivíduo à comunidade e, quiçá, priorizavam a própria nação. É dessa maneira que se pode entender a adoção, a partir do início do século, de projetos de eugenia que visavam controlar a reprodução da população, privilegiando um tipo cada vez mais branqueado. Em segundo lugar, a revolta permite entender impasses próprios a esse final de século, com tantas utopias tão pouco partilhadas. Na revolta, diferentes “Brasis” estavam em questão; muitos projetos, em pauta.
Angela Marques da Costa. 1890-1914: no tempo das certezas. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 120-2.