Muita gente considera o catch um esporte ignóbil. O catch não é um esporte, é um espetáculo, e é tão ignóbil assistir a uma representação da dor, no catch, como ao sofrimento de Arnolfo ou de Andrômaca.
Existe, no entanto, um falso catch, pomposo, com a aparência inútil de um esporte regular; mas esse não tem qualquer interesse. O verdadeiro — impropriamente chamado catch amador — realiza-se em salas de segunda classe, onde o público adere espontaneamente à natureza espetacular do combate, como o público de um cinema de bairro. Ao público pouco importa que o combate seja falseado ou não; o futuro racional do combate não lhe interessa: o catch é uma soma de espetáculos, sem que um só seja uma função: cada momento impõe o conhecimento total de uma paixão que surge, sem jamais se estender em direção a um resultado que a coroe.
Assim, a função do lutador não é ganhar, mas executar exatamente os gestos que se esperam dele. O catch propõe gestos excessivos, explorados até o paroxismo da sua significação. Esta função de ênfase é a mesma do teatro antigo, cuja força — língua — e cujos acessórios — máscaras e coturnos — concorriam para fornecer a explicação exageradamente visível de uma necessidade. O gesto de um lutador vencido, significando uma derrota que não se oculta, mas se acentua, corresponde à máscara antiga, encarregada de significar o tom trágico do espetáculo. O lutador prolonga exageradamente a sua posição de derrota, caído, impondo ao público o espetáculo intolerável da sua impotência. No catch, como nos teatros antigos, não se tem vergonha da dor, sabe-se chorar, saboreiam-se as lágrimas.
Roland Barthes. Mitologias. Rio de Janeiro: DIFEL, 2010, p. 15-26 (com adaptações).