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Tudo corria sem mais, a oficina mal dava para o pão e para a escola do miúdo. Mas eis que começaram a aparecer, pelos recantos da casa, papéis rabiscados com versos. O filho confessou, sem pestanejo, a autoria do feito.


— São meus versos, sim.


O pai logo sentenciara: havia que tirar o miúdo da escola. Aquilo era coisa de estudos a mais, perigosos contágios, más companhias.


Dona Serafina defendeu o filho e os estudos. O pai, conformado, exigiu: então, ele que fosse examinado.


Olhos baixos, o médico escutou tudo, sem deixar de escrevinhar num papel. Aviava já a receita para poupança de tempo. Com enfado, o clínico se dirigiu ao menino:


— Dói-te alguma coisa?


— Dói-me a vida, doutor.


O doutor suspendeu a escrita. A resposta, sem dúvida, o surpreendera. Já Dona Serafina aproveitava o momento: Está a ver, doutor? Está a ver? O médico voltou a erguer os olhos e a enfrentar o miúdo:


— E o que fazes quando te assaltam essas dores?


— O que melhor sei fazer, excelência.


— E o que é?


— É sonhar.


Na semana seguinte, foram os últimos a ser atendidos. O médico, sisudo, taciturneou: o miúdo não teria, por acaso, mais versos? O menino não entendeu.


— Não continuas a escrever?


— Isto que faço não é escrever, doutor. Estou, sim, a viver. Tenho este pedaço de vida – disse, apontando um novo caderninho – quase a meio.


O médico chamou a mãe, à parte. Que aquilo era mais grave do que se poderia pensar. O menino carecia de internamento urgente.


— Não temos dinheiro – fungou a mãe entre soluços.


— Não importa – respondeu o doutor.


Que ele mesmo assumiria as despesas. E que seria ali mesmo, na sua clínica, que o menino seria sujeito a devido tratamento. E assim se procedeu.


Hoje quem visita o consultório raramente encontra o médico. Manhãs e tardes ele se senta num recanto do quarto onde está internado o
menino. Quem passa pode escutar a voz pausada do filho do mecânico que vai lendo, verso a verso, o seu próprio coração. E o médico, abreviando silêncios:


— Não pare, meu filho. Continue lendo...


COUTO, Mia. O menino que escrevia versos. Disponível em: <http://www.releituras.com/
miacouto_menu.asp>. Acesso em: 14 abr. 2016. Adaptado.

 

Sobre os aspectos linguísticos e estilísticos presentes no texto, analise as afirmativas e, em seguida, marque com V as verdadeiras e com F as falsas.


(    ) O conector “Mas”, em “Mas eis que começaram a aparecer, pelos recantos da casa, papéis rabiscados com versos”, é uma conjunção adversativa que introduz um fato não esperado no contexto familiar descrito.


(    ) A expressão “papéis rabiscados com versos” completa o sentido da locução verbal “começaram a aparecer”, sugerindo objetos estranhos àquele espaço, além de descontextualizados.


(    ) A forma verbal “surpreendera” apresenta uma ação verbal pretérita, posterior ao ato de o médico suspender a escrita e inadequada à profissão por ele exercida.


(   ) O neologismo que aparece em “O médico, sisudo, taciturneou” se desenvolve a partir de um adjetivo e insinua uma ação caracterizada pela melancolia e pelo mau humor do doutor.


(   ) O termo preposicionado “de vida”, em “Tenho este pedaço de vida”, modifica “pedaço”, metaforizando os versos, que são traduzidos pelo menino como a sua própria existência.


A sequência correta, considerando a marcação de cima para baixo, é a



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