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Objeto da moda
Um objeto estranho ameaça incorporar-se à elegância masculina. Seu aparecimento ocorreu na Itália, e sua presença já se faz sentir em outras cidades européias. É a maçaranduba.
A primeira singularidade da maçaranduba consiste em que ela absolutamente não participa da sorte das demais peças do equipamento humano a que se junta. É que a maçaranduba fica perto do vestuário, sem se ligar a ele. É ciosa de sua independência, ao contrário dos outros elementos que colaboram na apresentação do homem em público. Estes seguem conosco na condição de servos dóceis, ao passo que ela mantém liberdade de movimentos. E exige de nossa parte atenções especiais, sob pena de abandonar-nos à primeira distração. Concorda em fazer-nos companhia, mas sem o compromisso de aturar-nos o dia inteiro. Dir-se-ia, mesmo, que nós é que a acompanhamos no seu ir e vir pretensiosa pelas ruas.
A maçaranduba está sempre à mostra, ostensiva e vaidosa. Sua tendência é para assumir a liderança do conjunto e exibir-se em evoluções fantasiosas, que exigem certas habilidades do portador. Assim, quando não tem o que fazer (e de ordinário não tem) descreve círculos e volteios que pretendem ser graciosos em sua gratuidade.
A maçaranduba parece ter mau gênio? Parece, não; tem. Já o demonstrou sempre que algum transeunte lhe despertou antipatia ou lhe recordou episódios menos agradáveis. Ela não é de suportar opiniões contrárias às suas. À falta de melhor argumento, na polêmica, ergue-se inopinadamente, avança como um raio e procura alcançar a parte doutrinária alheia nos pontos mais vulneráveis, desde o lombo até os óculos. Sua agressividade impulsiva costuma levá-la à polícia, quando não se recolhe inerte e indiferente a um canto deixando que seu portador pague a nota dos estragos.
A maçaranduba é basicamente feita de madeira, às vezes se beneficia de espécies vegetais não-compactas, o que lhe permite estocar recursos ofensivos de grande temibilidade. Ao vê-la aproximar-se, tome cuidado, pois sua ira não se satisfaz com simples equimoses.
A impertinência da maçaranduba, para não dizer arrogância, deve-se talvez ao fato de que em outras eras foi símbolo de poder e, sob formas diversas, esteve ligada à realeza e a seu irmão gêmeo, o absolutismo. Em mãos governamentais, era duplamente terrível: pela contundência material e pela espiritual.
Diga-se em favor da maçaranduba, para que o retrato não fique excessivamente carregado, que algumas espécies são inclinadas à generosidade, e se comprazem em ajudar pessoas encanecidas ou faltas de visão. Contudo, trata-se de exceção.
Carlos Drummond de Andrade. Folha da Tarde, 1.º/2/1973 (com adaptações).
A partir da análise do vocabulário do texto, julgue se as duas equivalências de sentido apresentadas no item abaixo satisfazem ao contexto.
"arrogância" = orgulho e "encanecidas" = encarecidas