Os algoritmos de redes sociais serão o fim da verdade?
Quem define o que é verdade? É um questionamento corriqueiro que demonstra a distopia que vivemos. A verdade se impõe, ela é, simples assim. Verdade é constituída de fatos objetivos e verificáveis. A questão surge porque distorcemos, sem perceber, o conceito de verdade. Muitas vezes a palavra verdade é usada para descrever outra coisa, algo que seja mais palatável para um grupo, que geralmente se chama de narrativa.
Um estudo publicado na revista Nature em janeiro de 2017 mostra que, na lógica de massas, a resposta “surpreendentemente popular” tende a ser mais adotada que a verdade dos fatos. A técnica do estudo consistiu em fazer perguntas a grupos específicos e ter um detalhamento a mais, diferenciando o que as pessoas acham que é a resposta correta e o que elas pensam que seria a resposta mais popular. Chamou-se esse processo de “algoritmo do surpreendentemente popular”.
Diante do dilema moral, nossa tendência é condenar as pessoas que optam pela corrente majoritária. Ocorre que todos nós já fizemos isso em algum momento, seja por necessidade de aceitação ou de sobrevivência. É algo que faz parte do nosso cotidiano. É melhor ser feliz ou ter razão?
Isso permeia toda a convivência humana. Pense na sua família e amigos. É comum abandonarmos discussões infrutíferas fingindo concordar com algo de que discordamos. Isso não é uma falha, é uma tática de sobrevivência em grupo escolher nossas brigas. Pense agora na vida educacional e profissional. Esse mecanismo geralmente é descrito como engolir sapos.
O que muda nas redes sociais é o contexto. Acabamos sempre enfiados nas famosas bolhas, onde assumimos que existe uma opinião de consenso ou incrivelmente popular.
Isso potencializa muito o efeito natural de desprezar o que sabemos ser a verdade para optar pelo que é mais popular dentro do grupo. Ocorre que essa prática molda nossa mente, cria um hábito. As situações em que enfrentamos o dilema entre optar pela verdade ou pelo pertencimento são aumentadas num nível de normalizar a opção pela aderência ao grupo sempre.
Aceitar a condição humana é um desafio gigantesco. Temos vergonha de ser quem somos e temos a oportunidade de projetar nas redes a imagem do ser ideal que gostaríamos de ser. É uma tentação gigantesca para abolir a verdade. Não é possível, no entanto, ter avanços para as sociedades humanas abrindo mão da realidade objetiva. Passou da hora de refletir sobre esses temas. Quanto mais a tecnologia avança, mais precisamos entender de gente. É um processo tão doloroso quanto necessário.
(Madeleine Lacsko. Disponível em: <https://www.gazetadopovo.com.br. Acesso em: 06.08.2023. Adaptado.)