Enunciados de questões e informações de concursos
A atrofia virtual dos sentidos
Vivemos hoje o paradoxo entre a exuberância na oferta de meios para ouvir música – e para se comunicar nos mais diferentes níveis hierárquicos – e uma atrofia na qualidade da experiência sonora e musical. Digo isso constatando que cada vez se ouve um número menor de músicas e de uma forma pouco recomendada. À medida que as ofertas tecnológicas em comunicação se multiplicam num leque amplo de equipamentos, protocolos e linguagens codificadas, observa-se um movimento contrário, uma guetização, uma segmentação extrema que termina por apartar as diferenças e criar nichos praticamente secretos de acesso e fruição. Ou seja, além das esferas facilitadoras de consumo, de simplificação prática das tarefas do dia-a-dia, em que medida a capacidade de comunicação está realmente se ampliando? À primeira vista, parece que toda essa facilitação traz um verdadeiro avanço e ganho na comunicação social, embora uma característica básica da linguagem digital seja a de operar por faixas, por grupos, por segmentação.
Com relação à escuta, a multiplicação dos equipamentos que num primeiro momento ofereciam uma qualidade baixa na gravação e reprodução digital, hoje oferece a qualidade que o dinheiro de cada um puder comprar, sem restrições. Essa miniaturização e compactação com que operam se reverteria em uma maior capacidade e qualidade na experiência musical do consumidor.
No entanto alguns aspectos de sua utilização chamam a atenção. O caso dos fones de ouvido, do tocador portátil, por exemplo. Além de nocivos ao aparelho auditivo, os fones isolam a pessoa do ambiente externo. Assim, a atrofia da escuta se verifica em dois pontos: tomando os sites na Internet como fonte provedora de informação musical, a experiência da descoberta de músicos, estilos, grupos por meio da própria presença em shows, apresentações, se restringe, sendo direcionada apenas para aqueles grupos bem cotados nos sites de download. É uma ilusão achar que as pessoas, em sua grande maioria, navegam na Internet em busca do desconhecido – muito pelo contrário.
O segundo ponto que gera atrofia na escuta é fisiológico mesmo. O massacrante número de horas em que o indivíduo passa colado aos fones de ouvido diminui a capacidade quantitativa e qualitativa da percepção sonora. O músculo do ouvido, literalmente, se enrijece.
(TRAGTENBERG, Lívio. Folha de S. Paulo, 16 abr. 2006.)
Para o autor, a experiência musical das pessoas na atualidade é: