O quadro de incertezas imposto pela pandemia de covid-19 deixou especialistas em alerta com relação a alguns vícios presentes entre os brasileiros, como o tabagismo e o alcoolismo. O aumento significativo no consumo dessas drogas durante este período preocupa o professor do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFMG, Frederico Garcia, coordenador do Centro de Referência em Drogas da universidade, que estima uma possível epidemia de dependência química após a atual situação sanitária.
Em pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz em 2020, 18% dos entrevistados relataram aumento no consumo de álcool e 34%, de tabaco.
Segundo o professor Frederico Garcia, isso pode ser explicado pelo isolamento social exigido durante a pandemia e a consequente restrição de liberdade. “Esse consumo pode vir como um remédio assintomático que tem consequências a longo prazo”, afirma. Ainda segundo ele, já existem estudos que acompanharam contextos de guerras e epidemias e verificaram sua relação com o aumento no consumo de drogas.
Há quem diga que uma dose de vinho ou um cigarro por dia não faz mal a ninguém, mas o segredo está na genética de cada pessoa. A tendência de se desenvolver um vício por álcool ou tabaco pode se tornar real com o primeiro contato com a droga. “A pessoa que tem essa predisposição genética deve fazer todo o esforço para evitar o consumo precoce e diário dessas substâncias, porque o risco de se tornar dependente é significativo e importante”, frisa o professor.
O professor explica que as populações de baixa renda, do sexo masculino e de maior idade são os principais alvos do tabagismo, diferentemente das bebidas alcoólicas, cujo consumo envolve, geralmente, adolescentes entre catorze e quinze anos de idade de maior renda, sendo o núcleo familiar o principal meio de iniciação ao vício.
Com o passar dos anos, o que era um uso temporário se transforma em dependência e, na falta da droga, surge a síndrome de abstinência como um dos principais problemas a serem enfrentados. A ausência da droga no organismo resulta no aumento da atividade do sistema nervoso, que deixa o indivíduo inquieto e incomodado. Em alguns casos, pode-se chegar a situações de agressividade e culminar com problemas físicos, como convulsões e alteração da pressão arterial. “A abstinência é uma urgência clínica que precisa ser avaliada e tratada porque ela pode ser, em alguns casos, até mortal”, avalia o professor.
Além da abstinência, as drogas também podem desenvolver outros transtornos. No caso do tabaco, a nicotina é a principal atuante no organismo e pode causar hipertensão, afetar o metabolismo da glicose e gordura e alterar o apetite. Já o álcool afeta os processos inflamatórios e provoca esteatose hepática, ou seja, um acúmulo de gordura no fígado.
Os primeiros passos para o tratamento de dependências como o tabagismo e o alcoolismo é reconhecer o vício, suas consequências negativas e optar por uma mudança de hábitos. Após o diagnóstico, é preciso compreender o papel da droga no cotidiano do indivíduo e o que impulsiona o seu uso recorrente.
Acompanhamento médico e terapia farmacológica com o auxílio de remédios também são necessários, uma vez que podem agir para controlar a síndrome de abstinência e impedir o avanço de doenças psiquiátricas. O contato frequente com parentes e amigos, mesmo de forma remota, nestes tempos de pandemia, pode amenizar o estresse diário para que se evite o consumo de bebidas alcoólicas e cigarros.
Internet: <medicina.ufmg.br> (com adaptações).