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Como a linguagem funciona
Os jornalistas dizem que um cachorro morder um homem não é notícia, mas um homem morder um cachorro é notícia. É esta a essência do instinto da linguagem: a linguagem transmite notícias. As cadeias de palavras denominadas “frases” não são apenas estimulantes da memória, que fazem você se lembrar do homem e do melhor amigo do homem, deixando que você complete o resto; na verdade elas lhe dizem quem fez o que para quem. Portanto, tiramos mais da maioria dos fragmentos de linguagem do que Woody Allen tirou de Guerra e paz, que leu em duas horas depois de um curso de leitura dinâmica: “É sobre uns russos.” A linguagem nos permite saber como os polvos fazem amor, como remover manchas de cereja e por que Tad ficou inconsolável B), e se os Red Sox irão vencer o campeonato mundial sem um bom arremessador A) reserva, e como construir uma bomba atômica no porão da sua casa, e como Catarina, a Grande, morreu, entre outras coisas.
Quando os cientistas se deparam com truques aparentemente mágicos na natureza, como morcegos que capturam insetos em plena escuridão ou salmões que voltam para seu rio natal para reproduzir, procuram os princípios de engenharia que existem por trás deles. No caso dos morcegos, descobriu-se que o truque era um sonar; no caso dos salmões, eles seguem pelo faro o rastro de seu percurso. Que truque existe por trás da capacidade D) do Homo sapiens de comunicar que homem morde cachorro?
Na verdade, não há um truque, mas dois, associados ao nome de dois estudiosos europeus do século dezenove. O primeiro princípio, estabelecido pelo linguista suíço Ferdinand Saussure, é “a arbitrariedade do signo”, a combinação totalmente convencional de um som com um significado. A palavra cachorro não se parece com um cachorro, mas mesmo assim significa “cachorro”. Isso acontece porque todo falante de português passou por um idêntico ato de aprendizagem mecânica na infância que liga o som ao significado. Ao preço dessa memorização padronizada, os membros de uma comunidade linguística desfrutam de um enorme benefício: a possibilidade D) de transmitir um conceito de mente para mente de modo praticamente C) instantâneo. Às vezes o casamento entre som e significado é engraçado. Como Richard Lederer comenta em Crazy English (inglês louco), blueberries são blue [azuis] mas cranberries não são cran [garças]. No português também ocorre essa falta de correspondência entre forma e significado, como em cachorro-quente e pé de moleque. Mas pense na alternativa “sensata” de descrever um conceito de modo que os receptores possam apreender o significado a partir de sua forma. É um processo que desafia de tal forma a inventividade, tão comicamente falível, que o transformamos em jogos como Imagem e Ação e charadas.
O segundo truque existente por trás do instinto da linguagem pode ser sintetizado numa formulação de Wilhelm von Humboldt, que pressagiava Chomsky: a língua “faz uso infinito de meios finitos”. Percebemos a diferença entre o corriqueiro cachorro morde homem e o inaudito homem morde cachorro devido à ordem em que cachorro, homem e morde estão combinados. Ou seja: utilizamos um código para traduzir ordens de palavras em combinações de ideias e vice-versa. Esse código ou conjunto de regras é o que nos permite usar a linguagem para comunicar E).
PINKER, Steven. O instinto da linguagem: como a mente cria a linguagem. Trad. Claudia Berline. São Paulo: Martins Fontes, 2004. p. 95-96. [Adaptado].
Com base no texto e na norma padrão escrita, assinale a alternativa correta.