O desastre
Achava-me um dia diante dos guichês do London Bank, à espera de que o pagador gritasse a minha chapa, quando vi a cochilar num banco ao fundo certo corretor de negócios meu conhecido. Fui-me a ele, alegre da oportunidade de iludir o fastio da espera com uns dedos de prosa amiga.
-Esperando sua horinha, hein? - disse-lhe com um tapa amigável no ombro, enquanto me sentava ao seu lado.
- É verdade. Espero pacientemente que me cantem o número e, enquanto espero, filosofo sobre os males que traz à vida a desonestidade dos homens.
- ?
- Sim, porque se não fosse a desonestidade dos homens tudo se simplificaria grandemente. Esta demora no pagamento do mais simples cheque, donde provém? Da necessidade de controle em vista dos artifícios da desonestidade. Fossem todos os homens sérios, não houvesse hipótese de falsificações ou abusos, e o reconhecimento de um dinheiro far-se-ia instantâneo. Ponho-me às vezes a imaginar como seriam as coisas cá na Terra se um sábio eugenismo desse combate à desonestidade por meio da completa eliminação dos desonestos. Que paraíso!
- Tem razão - concordei eu, com os olhos parados de quem pela primeira vez reflete numa ideia - A vida é complicada, existem leis, polícia, embaraços de toda espécie, burocracia e mil peias, tudo porque a desonestidade nas relações humanas constitui, como dizes, um elemento constante. Mas é mal sem remédio...
E por ai fomos, no filosofar vadio de quem não possui coisa melhor a fazer e apenas procura apenas matar o tempo.
Passamos depois a analisar vários tipos ali presentes, ou que entravam e saíam, na azáfama peculiar aos negócios bancários.
O meu amigo, frequentador que era de bancos, conhecia muito deles e foi-me enumerando particularidades curiosas relativas a cada qual.
(LOBATO, Monteiro. O Presidente Negro. Lafonte. p 19/20.)