O caminho de volta
“Sossega, menino, parece que tem bicho-carpinteiro no corpo!”, ralhava minha mãe. Nunca consegui saber com exatidão como era o tal bicho-carpinteiro. Luís da Câmara Cascudo, mestre de sapiência maior nessas coisas do povo, nada esclarece, mas, pelo sentido da frase, dá para entender que é alguma aflição que nos faz viver num movimento perpétuo. Se é isso mesmo, não creio que seja defeito para um repórter. Pelo menos, nos faz sempre voltar para a cidade de onde partimos, que é aquela cujas esquinas conhecemos, onde esbarramos nas ruas com conhecidos ou com velhos amigos, cujos cheiros, sons e cores nos trazem lembranças. É muito bom ter para onde voltar, posso garantir, tendo passado tantos anos proibido de fazer esse retorno. Joaquim du Bellay, poeta renascentista francês, nos ensina que “feliz é quem, como Ulisses, fez uma bela viagem, e, depois, voltou, cheio de sabedoria, a viver o resto de seus dias entre os seus parentes”.
ALVES, Marcio Moreira. O Globo. 18 dez. 2003.