Valores de uma Nova Civilização
Nós, do Fórum Social Mundial, acreditamos em certos valores, que iluminam o nosso projeto de transformação social e inspiram a nossa imagem de um novo mundo possível. Aqueles que se reúnem em Davos (...) também defendem valores. Não devemos subestimá-los, pois eles acreditam em três grandes valores e estão dispostos a lutar com todos os meios para salvaguardá-los (...): o dólar, o euro e o yen.
A principal característica comum destes três valores é a sua natureza estritamente quantitativa: eles não conhecem o bem e o mal, o justo e o injusto. Conhecem apenas quantidades, números, cifras: quem tem um bilhão – de dólares, euros ou yens – vale mais do que quem tem só um milhão, e muito mais do que aquele que só tem mil. E, obviamente, aquele que não tem nada, ou quase nada, nada vale na escala de valores de Davos. É como se não existisse. Está fora do mercado e, portanto, do mundo civilizado.
Juntos, os três valores constituem uma das divindades da religião econômica liberal: a Moeda. As outras duas divindades são o Mercado e o Capital. (...) Este fetichismo da mercadoria ou esta idolatria do mercado, do dinheiro e do capital é um culto que tem suas igrejas (as Bolsas de Valores) e seus Santos Ofícios (FMI, OMC). (...)
Esta civilização do dinheiro e do capital transforma tudo em mercadoria que se vende pelo melhor preço. Até as pessoas. A grife da camisa que visto me imprime valor. Em outras palavras, se chego à sua casa de ônibus ou bicicleta, tenho um valor Z. Se chego de BMW, tenho um valor A. Sou a mesma pessoa e, no entanto, a mercadoria que me reveste me imprime mais ou menos valor. (...)
Mas o Fórum Social Mundial encarna também a aspiração a um outro tipo de civilização, baseada em outros valores que não o dinheiro ou o capital. São dois projetos de civilização e duas escalas de valores que se enfrentam, de forma antagônica e perfeitamente irreconciliável, no umbral do século XXI.
Quais os valores que inspiram este projeto alternativo? Trata-se de valores qualitativos, éticos e políticos, sociais e culturais, irredutíveis à quantificação monetária. (...)
Podemos partir dos três valores que inspiraram a Revolução Francesa de 1789 e, desde então, estão presentes em todos os movimentos de emancipação social da história moderna: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Há outro valor que, desde 1789, é inseparável dos outros três: a democracia. Não só no sentido limitado que este conceito político tem no discurso liberal/ democrático – a livre eleição de representantes. Esta democracia representativa é necessária, mas insuficiente. Necessitamos de formas superiores, participativas. (...)
A estes grandes valores, produto da história revolucionária moderna, devemos acrescentar um outro, que é ao mesmo tempo o mais antigo e o mais recente: o respeito ao meio ambiente. A mundialização capitalista é responsável por uma destruição e envenenamento acelerados – em crescimento geométrico – do meio ambiente.
Para concluir: um outro mundo é possível, baseado em outros valores, (...) o futuro começa desde agora.
Michael Löwy e Frei Betto. Disponível em: www.dhnet.org.br/direitos/ militantes/freibetto/betto02.html. Acesso em jul. 2005. (adaptado)