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Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região
Questão 1 de 1

Leia um trecho da crônica “O Risadinha”, de Paulo Mendes Campos, para responder a questão.

 

1. Seria melhor dizer que ele [Risadinha] não teve infância. Mas não é verdade. Eu o conheci menino, trepando às árvores, armando alçapão para canários-da-terra, bodoqueando1 as rolinhas, rolando pneu velho pelas ruas, pegando traseira de bonde, chamando o professor Asdrúbal de Jaburu. Foi este último um dos mais divertidos e perigosos brinquedos da nossa infância: o velho corria atrás da gente brandindo a bengala, seus bastos bigodes amarelos fremindo sob as ventas vulcânicas.

 

2. Nestor, em suma, teve a meninice normal de um filho de funcionário público em nosso tempo, tempo incerto, pois os recursos da Fazenda na província eram magros, e os pagamentos se atrasavam, enervando a população.

 

3. Seus companheiros talvez nem soubessem que se chamasse Nestor; era para todos o Risadinha. Falava pouco e ria muito, um riso de fato diminutivo, nascido de reservados solilóquios, quase sempre extemporâneo. Certa feita, na aula de francês, quando entoávamos em coro o presente do subjuntivo do verbo s`en aller, Risadinha pespegou uma bólide de papel bem na ponta do nariz do professor, que era muito branco, pedante a capricho e tinha o nome de Demóstenes. O rosto do mestre passou do pálido ao rubro das suas tremendas cóleras. Um dos seus prazeres, sendo-lhe vetado por lei castigar-nos com o bastão, era desfiar em cima do culpado uma série de insultos preciosos, que ele ia escandindo um por um, sem pressa e com ódio.

 

4. − Levante-se, seu Nestor! Sa-cri-pan-ta! Ne-gli-gen-te! Si-co-fan-ta! Tu-nan-te! Man-dri-ão! Ca-la-cei-ro! Pan-di-lha! Bil-tre! Tram-po-lei-ro! Bar-gan-te! Es-troi-na! Val-de-vi-nos! Va-ga-bun-do!...

 

5. Pegando a deixa da única palavra inteligível, Risadinha erguia o dedo no ar e protestava, com ar ofendido:

 

6. − Vagabundo, não, professor.

 

7. Era um artista do cinismo, e sua momice de inocência era de tal arte que até mesmo seu Demóstenes não conseguia conter o riso. Como também somente ele já arrancara uma gargalhada do padre-prefeito, um alemão da altura da catedral de Colônia, num dia em que vinha caminhando lento e distraído, fora de forma.

 

8. − Por que o senhorrr não está na forma? − perguntou-lhe rosnando o padre, como se estivesse de promotor da Inquisição, diante de um herege horripilante.

 

9. − É porque estou com meu pezinho machucado, respondeu com doçura o Risadinha.

 

10.− E por que o senhorrr não está mancando?

 

11. Risadinha olhou com espanto para os seus próprios pés, começando a mancar vistosamente:

 

12.− Desculpe, seu padre, é porque eu tinha esquecido.

 

13. Foi um precursor de Cantinflas2 e, a despeito da opinião do leitor, nós lhe achávamos uma graça de doer a barriga.

 

(Adaptado de: CAMPOS, Paulo Mendes. Primeiras leituras: crônicas. São Paulo: Boa companhia, 2012)

 

1bodoquear: atirar pedra com estilingue. 2Cantinflas: nome artístico do humorista mexicano Fortino Mario Alfonso Moreno Reyes (1911-1993).

 

Pegando a deixa da única palavra inteligível, Risadinha erguia o dedo no ar e protestava, com ar ofendido:

– Vagabundo, não, professor. (5º e 6º parágrafos)

 

O termo sublinhado acima pode ser substituído, sem prejuízo para o sentido do texto, por:



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