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Texto 1

 

UMA BIOGRAFIA IMPROVÁVEL

 

O vírus é o parasita por excelência, incapaz de ser protagonista da própria vida. Ele precisa da ajuda de uma célula, da qual se apropria à força, sequestrando certas partes, para conseguir se replicar. Quando não está usufruindo do seu hospedeiro, o vírus navega pelo mundo, como um barco à deriva, esperançoso de encontrar uma ilha – um ser vivo dotado de células compatíveis com o seu material genético – onde possa atracar. Por vezes, o encontro é violento, ou patogênico, em termos técnicos: o náufrago se faz dono da ilha, consome todos seus recursos e vai embora depois, ainda faminto, rumo a ilhas similares (não sem antes se reproduzir aos milhares, para otimizar a nova empreitada). É essa a relação que temos com o novo coronavírus.

 

A segunda forma de o vírus se relacionar com o hospedeiro, e a mais comum, pelo que se sabe, é classificada na categoria “comensal”. Nesse encontro, o náufrago habita a ilha de forma sustentável, pesca seus peixes, bebe seus cocos, tomando cuidado para não extinguir nenhum recurso natural. Em outras palavras: o vírus vive dentro da célula, faz uso do maquinário dela, mas não a adoece. Não espalha seu material genético com tanta rapidez nem tenta matar aquela que tão bem o acolheu. É o tipo de relação menos estudada, justamente porque não provoca nenhum dano constatável.

 

Há ainda um tipo de interação de característica “mutualista”, em que tanto o vírus quanto o hospedeiro se beneficiam. Nesse encontro, o náufrago não só respeita as condições da ilha, como resolve aproveitar um terreno baldio para cultivar uma horta. A relação mutualista é como um casamento arranjado que tem tudo para não funcionar, mas acaba prosperando, por obra do acaso e pela capacidade de adaptação de cada cônjuge. Um exemplo: quando infectado com um tipo de densovírus, o piolho-cinzento-da-macieira desenvolve asas que o ajudam a alcançar novas plantas. Outro exemplo: certas abóboras se tornam menos atraentes para o besouro – uma praga – quando infectadas por uma espécie de potyvírus. Há vários casos. Uma infecção por herpes pode proteger camundongos contra a peste bubônica. O vírus da hepatite G retarda o desenvolvimento do HIV em humanos.

 

Virologistas gostam de dizer que o vírus é o organismo mais abundante no mundo. A estimativa é hipotética, dado que apenas 6 590 espécies foram catalogadas (a título de comparação, cientistas já descreveram mais de 1,2 milhão de organismos celulares). Ainda assim, faz sentido quando se pensa que cada espécie de bactéria, protozoário, fungo, planta e animal é infectada por seus vírus particulares. O Sars-CoV-2 é ilustrativo: habitava morcegos e pangolins, com os quais tinha uma relação saudável – como a do náufrago que usufrui da ilha sem esgotá-la – até sofrer uma mutação espontânea, que o tornou compatível com humanos. Foi assim que surgiu a Covid-19, sigla em inglês para a doença do coronavírus de 2019, quando o primeiro caso foi registrado na província chinesa de Wuhan.

 

“Quando um vírus encontra um novo hospedeiro, ele costuma causar uma doença muito severa, já que o corpo ainda não está preparado para combatê-lo”, explicou Zerbini [virologista, Francisco Murilo Zerbini, da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais.] “Com o passar do tempo, a tendência é que ele se torne menos nocivo.” A reconfiguração ocorre tanto por obra do organismo infectado, que vai criando anticorpos para combater o intruso, quanto do próprio vírus, que lucra mais, em termos de perpetuação genética, se mantiver o hospedeiro vivo, espalhando suas cópias como uma arma biológica. “Um vírus que te deixa de cama e te mata em questão de dias não vai ser transmitido para muita gente”, disse Zerbini. “Nesse sentido o novo coronavírus está na infância, já que nunca coevoluiu com o ser humano. É capaz de ele causar uma doença muito menos grave daqui a cinco ou dez anos.”

 

KAZ, Roberto. Uma biografia improvável. Revista Piauí, Edição 164, maio 2020. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/materia/umabiografia- improvavel/. Acesso em: 7 de junho de 2020.

 

Texto 2

 

A relação entre a crítica veiculada no texto 2 com o conteúdo abordado no texto 1 é a de que o vírus:



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