Concurso Público e Presunção de Inocência
Olá pessoal,
Atualizando a antiga jurisprudência, em overruling, o STF decidiu que o princípio da presunção de inocência impede a proibição de investigados que ainda não foram condenados de participar de concursos públicos. Seguindo o voto do Relator, Min. Roberto Barroso, o Tribunal entendeu que a mera existência de processo penal em curso não autoriza a eliminação de candidato em concurso público, externo ou interno, mesmo para promoção, e ainda que em carreiras da magistratura, funções essenciais à Justiça e da segurança pública:
“Como regra geral, a simples existência de inquéritos ou processos penais em curso não autoriza a eliminação de candidatos em concursos públicos, o que pressupõe: (i) condenação por órgão colegiado ou definitiva; e (ii) relação de incompatibilidade entre a natureza do crime em questão e as atribuições do cargo concretamente pretendido, a ser demonstrada de forma motivada por decisão da autoridade competente. 2. A lei pode instituir requisitos mais rigorosos para determinados cargos, em razão da relevância das atribuições envolvidas, como é o caso, por exemplo, das carreiras da magistratura, das funções essenciais à justiça e da segurança pública (CRFB/1988, art. 144), sendo vedada, em qualquer caso, a valoração negativa de simples processo em andamento, salvo situações excepcionalíssimas e de indiscutível gravidade” (RE 560.900, rel. Min. Roberto Barroso, julg. em 5/2/2020)
Segundo o Ministro Luiz Fux, que acompanhou o relator, enquanto pende o processo, não se sabe quem tem razão, e o processo é meio ‘hitchcockiano‘, ou seja, só se sabe ao final quem tem razão. A ratio decidendi desenvolvida pelo Ministro Roberto Barroso, envolve ainda as seguintes questões:
i) necessidade de condenação por órgão colegiado, de cognição exauriente, no sentido da condenação, sem necessidade de trânsito em julgado, para restrição à participação em certames;
ii) necessidade de que haja uma relação de pertinência entre a acusação e as atribuições do cargo em questão.
iii) a lei poderá reforçar o controle de acesso a tais cargos, dispondo, por exemplo, que eventual condenação judicial em primeira instância, ou mesmo a imposição administrativa de pena por infração disciplinar (respeitado, em qualquer caso, o contraditório), seria suficiente para a eliminação de candidato em concurso público, de acordo com o § 7º ao art. 37 da CRFB/1988, o qual determina que “A lei disporá sobre os requisitos e as restrições ao ocupante de cargo ou emprego da administração direta e indireta que possibilite o acesso a informações privilegiadas”.
O caso concreto versava sobre vedação de acesso do recorrido a curso de formação de Cabos Combatentes da Polícia Militar, requisito necessário à sua progressão funcional por antiguidade, por estar respondendo a processo penal no período da matrícula.
Ainda para o Ministro Barroso, a solução proposta satisfaz os princípios da razoabilidade ou proporcionalidade, que você já conhece, como consectários do princípio do devido processo legal em sentido substantivo ou objetivo, uma vez que:
(i) a decisão é adequada, pois a restrição que se impõe é idônea para proteger a moralidade administrativa;
(ii) a decisão não é excessiva (princípio da vedação do excesso), de vez que após a condenação em segundo grau a probabilidade de manutenção da condenação é muito grande e a exigência de relação entre a infração e as atribuições do cargo mitiga a restrição; e
(iii) a decisão é proporcional em sentido estrito, na medida em que a atenuação do princípio da presunção de inocência é compensada pela contrapartida em boa administração e idoneidade dos servidores públicos.
A tese aprovada em 6/2/2020, do Tema 22 é a seguinte:
“Sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.”